O Centro de Estágio do Seixal surgiu com quatro anos de atraso em relação à Academia do Sporting. Houve muito terreno para o Benfica recuperar relativamente à formação de jogadores, mas, hoje, os responsáveis encarnados garantem que estão "ao mesmo nível".

A 22 de Setembro de 2006, o Benfica inaugurava o centro de estágio, que vai além de excelentes condições para os seniores, pois permitiu ao clube apostar de forma extremamente profissional na formação de jovens, depois de anos em que foram poucos os que conseguiram chegar à equipa principal, e só Moreira, e agora Miguel Vítor, é que por lá permaneceu. A recente afirmação do defesa-central é vista como um ponto de viragem na escassez de futebolistas dos escalões mais jovens a aparecerem nos seniores. Esta é a lacuna que falta colmatar, comparativamente com o Sporting.

"A conjuntura do clube faz com que a aposta na formação seja maior e haja mais possibilidades de os jovens chegarem à equipa principal. Isso também começa a motivá-los a virem para o Benfica. No Sporting isso aconteceu durante muitos anos e agora começa a suceder também aqui", explicou ao DN sport Manuel Ribeiro, director do futebol de formação.

O dirigente confirma os problemas que surgiam quando tentavam seduzir algum jovem que o Sporting também queria. "Eles tinham outras condições de trabalho e os pais acabavam por influenciar os mais jovens, mas neste momento não me parece que isso aconteça", referiu. Nesta altura, ser adepto do Benfica não era suficiente. Agora, Nené diz que tudo é diferente. "Sabemos que já somos melhores porque crescemos depois [do Sporting] e quem cresce depois é sempre melhor", defende Nené, que partilha a função com Manuel Ribeiro, e que acredita que o Benfica pode agora "tirar" jogadores ao rival.

Uma das razões apontadas para o "vazio" na formação nos últimos anos foi a opção do então presidente João Vale e Azevedo em acabar com algumas equipas. Outra é a falta de ligação dos treinadores dos seniores com os jovens, algo que com Quique Flores está a mudar.

"Ao acabar com algumas equipas, alguns bons jogadores foram-se embora, como o caso do Rúben Amorim. Ainda hoje sentimos que essa medida foi péssima e somos prejudicados por isso, pois vários dos atletas que tínhamos escolhido para ficar, acabaram por sair", afirma Nené. As repercussões desta medida chegam ao nível financeiro. O Sporting fez muito dinheiro graças à venda de passes de jogadores como Cristiano Ronaldo, Ricardo Quaresma e Nani. O dirigente não hesita em afirmar que o Benfica "perdeu dinheiro" ao mandar jogadores naquela altura.

A curto prazo é esperado que a formação comece a render. "Antes andávamos com a casa às costas", relembrou Manuel Ribeiro, referindo-se ao tempo em que tinham de treinar em diferentes campos de outros clubes. Além do Seixal, o Benfica tem centros de treino "em Braga, Aveiro, Ferreiras e Viseu" para escolinhas e infantis. Protocolos só com os brasileiros do Vasco da Gama. "Houve a possibilidade de fazer alguns em África, mas entendemos que não era o melhor momento", sublinha Nené.

Mentalidade de Rui Costa e sensibilidade de Quique Flores

Certeza. Directores dizem que diferenças para outros anos, bem recentes, são abismais.

Rui Costa pendurou as chuteiras no ano passado e tornou-se o novo director desportivo do Benfica. A sua "chegada" aos gabinetes trouxe uma "nova mentalidade" na abordagem ao futebol de formação, garantem Nené e Manuel Ribeiro. Mas o trabalho não tem sido apenas do jogador, antes considerado um "maestro" dentro dos relvados, é que também o treinador da equipa principal, Quique Flores, está a provar a fama que trazia de Espanha: a apetência em apostar nos jovens.

"Pelo seu passado na formação e pelo facto de ter sensibilidade suficiente para saber o que é a transição dos escalões jovens para a equipa principal podemos dizer que melhorámos. Há maior abertura e uma maior interligação entre profissionais e amadores. Por exemplo, nos últimos anos quase não havia incorporação de juniores nos treinos da equipa principal e agora, com este treinador, há quase todos os dias", começou por dizer Manuel Ribeiro, fazendo depois uma comparação com o passado recente.

"Há uma diferença abismal na abertura ao futebol jovem. Neste ano ficou no plantel o Miguel Vítor e abriu portas para que também no próximo ano mais dois ou três possam chegar ao plantel principal. Só o facto de o Benfica ter recentemente proposto contratos profissionais a alguns jogadores é sinal da aposta que agora está a ser feita. Há treinadores que têm mais sensibilidade para as camadas jovens e neste momento temos um técnico desses, que olha e verifica in loco os atletas dos juniores e juvenis", disse, dando exemplos: "Quase todas as semanas Quique Flores chama juniores, e até juvenis, aos treinos. É também presença bastante assídua nos treinos e sobretudo nos jogos das camadas jovens. Só podendo trabalhar com os atletas é que os treinadores principais também podem saber se poderão ser úteis para o futuro. Um exemplo interessante, o Quique já nem diz que quer um avançado, um defesa ou um médio para treinar com o plantel, ele diz que quer trabalhar, por exemplo, com o Yartey, com o João, etc.", referiu Manuel Ribeiro.

No passado recente do Benfica há casos de jogadores como Rúben Amorim (novamente na Luz), Miguel Veloso (Sporting), Miguel Lopes (Rio Ave), entre outros, que não foram devidamente aproveitados. De acordo com Nené, não foi feito tudo para que esses futebolistas não tivessem ficado na Luz.

"Estou no futebol de formação há muitos anos. E todos os anos tínhamos um, dois ou três jogadores para os seniores. Mas para tal acontecer os jogadores que tinham essas capacidades teriam de ser observados pelos treinadores da equipa principal, e isso foi o que não aconteceu. Como os treinadores não os observaram, acabaram por não perceber os talentos que tinham. E isto que o Quique está a fazer é muito importante", salientou.

Número reduzido de estrangeiros

As polémicas da cada vez mais forte aposta em jogadores estrangeiros por parte dos encarnados, também nos escalões jovens, têm feito correr muita tinta. O Benfica, no entanto, defende-se e apresenta dados concretos. "A imagem que passa para fora é errada. Temos 15 equipas e no total 18 estrangeiros, dois deles em processo de naturalização, isto num universo de 304 futebolistas. Se fizermos uma análise aos outros clubes, não sei se têm tão poucos como nós", contou Nené.

A aposta em jogadores de outras nacionalidades, no entanto, não é escondida. E o director do futebol de formação explica o processo deste recrutamento. "São observados nos próprios locais. Os que não temos dúvidas são logo contratados, outros terão de prestar provas. Temos procurado em África, no Brasil, mas também alguns foram contratados a clubes portugueses", afirmou.

Ainda dentro deste âmbito, e em outros tempos, discutia-se muito a idade de futebolistas vindos, nomeadamente, de África. Os encarnados ainda encontram casos desses, mas são ultrapassados. "Hoje em dia é fácil de solucionar esses problemas. Temos aqui, no Seixal, um laboratório em que fazem o teste e logo se detecta se estão a tentar enganar-nos. É raro acontecer, mas de vez em quando aparece. Mas também quando aparecem também os colocamos na devida categoria, se tiverem valor, claro", concluiu.

Fonte : http://dn.sapo.pt
Imagem : www.slbenfica.pt